Entenda o esqueça de corrupção no Ministério da Educação
Preso na última quarta-feira (22), Milton Ribeiro foi o quarto ministro da Educação indicado pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), ficando à frente da pasta do dia 16 de julho de 2020 até o dia 28 de março de 2022. Em três anos, o Ministério da Educação (MEC) já teve cinco ministros, maior rotatividade da Esplanada dos Ministérios.
Milton Ribeiro foi preso preventivamente após denúncias apontarem a existência de um “gabinete paralelo” dentro do Ministério. Pastor presbiteriano, Ribeiro era assessorado por outros dois pastores, que atuavam na distribuição de verbas federais destinadas à educação do país, mesmo sem terem vínculo com o MEC e com o governo federal.
A primeira denúncia foi realizada pelo jornal O Estado de S. Paulo, no dia 18 de março. Os pastores Gilmar Silva dos Santos, presidente da Convenção Nacional de Igrejas e Ministros das Assembleias de Deus no Brasil, e Arilton Moura, assessor de Assuntos Políticos da entidade, haviam participado de 22 compromissos oficiais no MEC, 19 deles com a presença do ministro.
Além de opinarem na destinação de recursos da pasta, os pastores intermediavam encontros com autoridades de governo estaduais, municipais e empresários.
Quatro dias após a primeira denúncia, o jornal Folha de S. Paulo, no dia 22 de março, revelou a gravação de uma conversa de Milton Ribeiro com prefeitos. O ministro afirmou que a priorizava a liberação verbas do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) para as prefeituras que tinham pedidos negociados pelos pastores.
“A minha prioridade é atender primeiro os municípios que mais precisam e, em segundo, atender a todos os que são amigos do pastor Gilmar”, afirmou. Em troca da liberação facilitada, as prefeituras deveriam apoiar a construção de igrejas nos municípios. “Foi um pedido especial que o presidente da República fez para mim sobre a questão do [pastor] Gilmar”, destacou o ministro.
Os recursos eram pagos de maneira mais rápida pois não seguiam o protocolo habitual, que envolveria assinaturas de termos de compromisso e contratos. Os primeiros levantamentos apontavam que haviam sido movimentados R$ 9,7 milhões, que beneficiaram 48 municípios entre os primeiros meses de 2021 e a descoberta do escândalo.
No mesmo dia, Milton Ribeiro publicou uma nota afirmando que “diferentemente do que foi veiculado, a alocação de recursos federais ocorre seguindo a legislação orçamentária, bem como os critérios técnicos do Fundo Nacional do Desenvolvimento da Educação (FNDE)”.
O ministro também afirmou que o presidente “não pediu atendimento preferencial a ninguém” e sim que “pudesse receber todos que nos procurassem”. Em nenhum momento o ministro questionou a veracidade da gravação.
No dia 23 de março, o Estadão divulgou uma nova reportagem, revelando que o pastor Arilton Moura havia solicitado R$ 15 mil antecipados para dar seguimento às demandas de educação da cidade de Luís Domingues (MA). A denúncia foi apresentada pelo prefeito do município, Gilberto Braga (PSDB), que afirmou que o pastor ainda pediu o pagamento de um quilo de ouro após a liberação dos recursos para construção de escolas e creches.
“Ele disse que tinha que ver a nossa demanda. De R$ 10 milhões ou mais, tinha que dar R$ 15 mil para ele só protocolar. E na hora que o dinheiro já estivesse empenhado, era para dar um tanto X. Para mim, como a minha região era área de mineração, ele pediu um quilo de ouro”, contou o prefeito.
No mesmo dia, a Procuradoria-Geral da União (PGR) pediu ao Supremo tribunal federal (STF) autorização para abrir um inquérito para investigar as denúncias envolvendo Milton Ribeiro e o MEC. A ministra Cármen Lúcia atendeu ao pedido no dia 24 de março.
“A gravidade do quadro descrito é inconteste e não poderia deixar de ser objeto de investigação imediata, aprofundada e elucidativa sobre os fatos e suas consequências, incluídas as penais”, afirmou a ministra.
Na sua tradicional live de quinta-feira, o presidente defendeu o então ministro. “O Milton, eu boto minha cara no fogo por ele. Estão fazendo uma covardia”, afirmou.
Milton Ribeiro foi exonerado a pedido no dia 28 de março. “Decidi solicitar ao Presidente Bolsonaro a minha exoneração do cargo, com a finalidade de que não paire nenhuma incerteza sobre a minha conduta e a do governo federal”, escreveu o ministro em uma carta com o pedido de demissão.
Até então o secretário-executivo do MEC, Victor Godoy foi nomeado ministro interino no dia 30 de março.
No dia 5 de abril, a Comissão de Educação do Senado ouviu o depoimento de três prefeitos sobre a suspeita de favorecimento indevido na destinação de verbas públicas do MEC. Os gestores afirmaram que o pastor Arilton Moura cobrava propina em dinheiro, ouro e até por meio da compra de bíblias para conseguir liberar verbas no MEC.
“O Arilton perguntou: ‘Você sabe muito bem como funciona, né? O Brasil é muito grande, não dá para ajudar todos os municípios. Mas eu consigo te ajudar com uma escola profissionalizante. Eu faço um ofício agora, chamo a Nely, você assina um ofício, coloco no sistema e, em contrapartida, você deposita R$ 40 mil na conta da igreja evangélica’”, relatou o prefeito e Boa Esperança do Sul (SP), José Manoel de Souza (PP).
O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), líder da oposição na Casa, conseguiu coletar as 27 assinaturas para abrir a Comissão Parlamentar de Inquérito do MEC no dia 8 de abril. A oposição trabalhava para reunir apoio ao colegiado desde a exoneração de Milton Ribeiro.
“Cabe ao Senado Federal cumprir o seu dever de monitoramento e fiscalização e apurar as irregularidades e crimes praticados na destinação das verbas do Ministério da Educação e do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE)”, escreveu Randolfe no requerimento de abertura da CPI.
No entanto, após ampla movimentação do governo para evitar a criação da comissão, os senadores Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) e Styvenson Valentim (Podemos-AC) retiraram suas assinaturas no dia 10 de abril. Os parlamentares alegaram que o momento da comissão não era o ideal por se tratar de ano eleitoral.
Faltando duas assinaturas, a CPI não foi criada.
No dia 18 de abril, o presidente Jair Bolsonaro oficializa Victor Godoy no Ministério da Educação. Na cerimônia de posse, o presidente deixou aberta a possibilidade de Milton Ribeiro voltar ao Ministério, caso as investigações da Polícia Federal (PF) não chegassem a conclusão.
“Eu já dei a ordem para efetivar, porque apenas interino ele tem certas dificuldades, até de locomoção. O que está acertado, em nada acontecendo com o ministro Milton, ele volta”, afirmou Bolsonaro.
No dia 5 de maio, a PGR solicitou ao STF que enviasse para a Justiça Federal, em Brasília, o inquérito aberto contra o ex-ministro. Como Ribeiro não era mais ministro, o Supremo não era mais o foro responsável pela investigação.
Após as investigações, a Justiça Federal determinou a prisão preventiva de Milton Ribeiro no dia 22 de junho, mais de três meses após a denúncia. O ex-ministro é investigado por acusado de corrupção passiva, prevaricação, advocacia administrativa, tráfico de influência.
Autorizada pela 15ª Vara Federal do Distrito Federal, a Operação “Acesso pago” também apreendeu os pastores Arilton Moura e Gilmar Santos.
O crime de tráfico de influência tem pena prevista de 2 a 5 anos de reclusão; corrupção passiva, 2 a 12 anos; prevaricação 3 meses a 1 ano de detenção; e advocacia administrativa, 1 a 3 meses. (Congresso em Foco).