Bolsonaro ‘deu um cavalo de pau’
(* Marcelo Tognozzi)………………………………
Apertem os cintos, o motorista deu um cavalo de pau. Bolsonaro trouxe para o governo Fábio Faria e Carlos Alberto Decotelli, o primeiro negro a comandar o Ministério da Educação em 131 anos de República.
A característica comum de ambos é a suavidade. São elfos num governo de ogros. Na sua 1ª entrevista –foi para O Globo! O Glo-bo!– o ministro Decotelli não xingou ninguém, foi logo avisando que não estava ali para fazer gestão ideológica e que privilegia o diálogo. Fábio Faria anunciou semana passada uma agenda focada em contatos com a mídia. Pretende visitar redações dos principais veículos de comunicação, conversar, mas principalmente ouvir.
Olhando para trás, percebemos o tamanho da guinada. Há um ano, ou mesmo 6 meses, 2 homens elegantes e cordiais como Decotelli e Faria não estariam no governo nem por sonho. No mínimo seriam chamados de isentões.
Carl von Clausewitz escreveu no seu clássico “Da Guerra” que a guerra é a política por outros meios. Mas esta nunca foi nem pode ser uma situação permanente, porque a eficiência da política vale mais pela busca dos meios de convivência entre divergentes do que se impor pela força. Daí a importância dos 2 novos ministros.
Um governo como o de Bolsonaro não conseguiria bons resultados sem um ministro comandando a comunicação, alguém com linha direta com o presidente. Fora disso, o resultado é a mediocridade, com a repetição da mesma estratégia da campanha do bate-boca e do enfrentamento, privilegiando as redes sociais acima de qualquer outro canal, desprezando a comunicação direta com o grande público, especialmente no momento de pandemia.
Falar apenas para convertidos prendeu o governo numa bolha. Sair dela será um grande desafio. Desprezaram as rádios, os 100 milhões de eleitores que vivem no interior, deram uma tremenda dor de cabeça aos produtores rurais atacando a China. Ao invés de bons de briga, acabaram virando os bons de birra.
A força centrípeta do cavalo de pau promoveu expurgos. Mas ao mesmo tempo está cevando alguns prováveis puxadores de votos em 2022, como a ativista Sara Winter, o ex-ministro da Educação Abraham Weintraub e o publicitário Sérgio Lima, que disputarão a eleição por São Paulo. Neste caso, o Supremo está sendo o maior cabo eleitoral dos 3. Não podemos esquecer que Marco Feliciano bombou de votos em São Paulo depois que a esquerda tentou impedir sua posse como presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara.
Bolsonaro tenta construir a paz com o Supremo e o Congresso, onde já abriu caminho com o Centrão, Fábio Faria e o PSD de Gilberto Kassab. Se prepara para enfrentar seus adversários na fase pós-pandemia, quando a oposição deverá ocupar as ruas numa campanha ruidosa como já fazem os apoiadores do presidente. Também começam a se mexer os apoiadores do ex-ministro Sergio Moro, até agora o principal candidato a candidato presidencial em 2022. Não faltarão emoções.
Em setembro o ministro Luiz Fux assume a presidência do Supremo até 2022. Será um estilo completamente diferente do de Dias Toffoli, com a corte sendo comandada por um simpatizante declarado da Lava Jato e da dura lex. Na vice estará a ministra Rosa Weber. Ela substituirá Fux, presidirá a Corte durante a próxima eleição, mas ficará apenas 13 meses no cargo e sairá em 2023, quando completará 75 anos. Será sucedida por Luís Roberto Barroso, com Edson Fachin na vice, presidente até 2025.
Ou seja: a tendência é que estes ministros mantenham o protagonismo político do Supremo. Não há possibilidade de recuo. Mesmo com Bolsonaro podendo nomear 2 ministros até o fim do mandato para as vagas de Celso de Melo e Marco Aurélio.
Portanto, nada como suavizar as relações com quem pode de fato criar problemas. Bolsonaro precisa de aliados capazes de dialogar. A oposição não dará a ele vida mansa, como deu a Lula na época do mensalão.
Tancredo Neves dizia que não se faz política sem vítimas, especialmente na hora do cavalo de pau. Mas há uma outra frase dele perfeita para certos personagens neste momento: “Se Deus não lhe deu a graça da humildade, peça a Ele a da dissimulação e finja que é modesto”.
(*Marcelo Tognozzi é jornalista e consultor independente).