Estado, desigualdade e crescimento no Brasil
—Artigo de Marcus Pestana—
Todos os governos e sociedade deveriam buscar um modelo de desenvolvimento que conjugasse crescimento econômico, estabilidade, sustentabilidade e justa distribuição de renda. Nem sempre isto ocorre.
No Brasil a desigualdade é extrema. Temos a maior concentração de renda, medida pelo índice de Gini, se comparados com todos os países integrantes da OCDE.
Isto tem levado especialistas a mergulhar no debate das raízes da desigualdade no Brasil e das alternativas de mudança. É o caso do economista e ex-presidente do Banco Central, Armínio Fraga, que produziu recentemente interessante estudo que leva o título deste meu artigo e que vale a pena ser lido e debatido.
A preocupação central é atacar as desigualdades no país para “deslanchar um círculo virtuoso de crescimento inclusivo e sustentável”, começando por desfazer a falsa contradição entre crescimento e distribuição de renda, oportunidades e riqueza.
O problema é que não só a desigualdade no Brasil é escandalosa, mas é permanentemente reproduzida por mecanismos institucionais e informais. Exemplo disto é que os dois maiores sistemas públicos, o previdenciário e o tributário, são regressivos. Dito de outra forma, transferem renda dos mais pobres para os mais ricos.
O estudo aponta que as reformas previdenciária, tributária e do Estado e a redução de subsídios e gastos tributários poderiam, ao longo de alguns anos, economizar 9% do PIB.
Do fim da Segunda Guerra Mundial a 1979, a renda per capita brasileira dobrou em relação à dos EUA. Mas a crise do petróleo e o choque de juros internacionais foram fatais. E a partir de então começamos a patinar numa sucessão de crises inflacionárias e de balanço de pagamento, insistindo no erro de apostar no fechamento da economia e na forte intervenção estatal e dando pouca ênfase em educação, produtividade e igualdade. A desigualdade caiu, a partir de 1988, fruto da nova Constituição e das políticas sociais dos governos FHC e Lula, notadamente a valorização do salário mínimo, a melhoria dos indicadores de saúde e os programas como o Benefício de Prestação Continuada (idosos e pessoas com deficiência) e a Bolsa Família. Mas estudos recentes mostram que a queda da desigualdade foi muito menor do que se imaginava.
Mas a má qualidade dos serviços públicos, a grande informalidade no mercado de trabalho e os raquíticos níveis de cobertura no saneamento retratam um quadro social ainda dramático. Soma-se a isto a desigualdade de oportunidades, notadamente na área educacional e a captura do aparato governamental por interesses patrimonialistas.
Armínio Fraga identifica ser possível diminuir drasticamente subsídios diretos e indiretos, introduzir mudanças na tributação da renda da pessoa física e da renda do capital, ampliar a tributação sobre heranças segundo padrões internacionais, combater a informalidade no mercado de trabalho e reduzir as taxas de juros, propiciando uma economia de 9% do PIB, que poderiam ser distribuídos na geração de superávit primário para estancar o agravamento da situação fiscal e do endividamento (3%) e no aumento de investimentos sociais, em pesquisa e infraestrutura (6%).
As escolhas são políticas. Cabe a todos nós optar qual o trecho do Hino Nacional vamos cantar: permanecer “deitado em berço esplêndido” ou mostrar que o” filho teu não foge à luta”. (Marcus Pestana/Congresso em Foco).