Colóquio, Um Dedo de Prosa

Em seu artigo, a professora/doutora Marilucia Flenik aborda o tema “O Direto ao Trabalho – 1º de Maio – Dia do Trabalhador

Registra o livro Atos dos Apóstolos que após a ressureição de Jesus, os discípulos anunciaram com coragem a boa nova, o tempo da conversão para o reino de Deus. Os primeiros cristãos viviam em comunidade, repartindo os seus bens. Nesse contexto São Paulo escreveu em uma de suas Cartas“aquele dentre vós que não trabalhar, não coma”.

Lutero e Calvino, ao reformar a doutrina católica, colocaram ênfase na graça de Deus para a salvação, ao invés das boas obras da caridade. Segundo eles a criatura humana é pequena demais para almejar a salvação mediante seu esforço próprio. É a graça de Deus que salva. Assim, diferentemente dos católicos, que almejam fazer jus a um lugar ao lado de Jesus Cristo praticando a caridade, os protestantes colocaram em primeiro lugar a fé, sem afastar, contudo, a necessidade de boas obras.

Porém, e aqui me inspiro em Max Weber, que escreveu o livro “A Origem do Capitalismo”, essa ênfase protestante no trabalho fez com que nos Estados Unidos da América desabrochasse o capitalismo com a pujança que existe até agora, e se estenderá ainda por um bom tempo.

Karl Marx definiu o homem como “um ser que trabalha”, comparando a sociedade com a colmeia de abelhas. A palavra “trabalho” deriva de tripalium – um instrumento romano de tortura. Na saída do paraíso, do Jardim de Eden, a criatura humana foi condenada a “tirar o seu sustento da terra com o suor do seu rosto”.

Trabalhar exige esforço, determinação, gera cansaço. Mediante o trabalho cada criatura humana gera algum tipo riqueza – seja a prestação de um serviço, seja a produção de algo. A moeda permite o sistema de circulação dos bens necessários à vida digna. Eis o direito ao trabalho como fundamental na sociedade humana. Sem este a espécie humana estaria extinta.

A fábula da cigarra e da formiga é ínsita do espírito capitalista desbragado: “cantou a cigarra o verão inteiro e quando no inverno foi procurar abrigo com as formigas, que haviam construído o formigueiro com a provisão de comida, estas lhe disseram: – cantaste? pois dance agora”.

Neste mundo de Deus outro é o espírito. Aquele que canta possui o dom de trazer alegria e esta é a sua contribuição para a comunidade. Cada um deve trabalhar de acordo com os “talentos” que recebeu. Quem recebeu 10 talentos será o médico, o empresário bem sucedido, o cientista, o professor, enfim, as mentes brilhantes que constrói o País. Quem recebeu 5 talentos e desenvolve com afinco suas habilidades, também estará contribuindo para o bem estar geral. O que não pode é o preguiçoso, que recebeu 1 talento, enterrá-lo e nada fazer. Foi para este que São Paulo escreveu: “aquele que não trabalhar, não coma”.

O trabalho no sentido de construção da vida deve ser visto em sentido amplo. A vovozinha que acalenta o neto está “trabalhando” pois ajuda a educar uma criança; quem cata os lixos recicláveis faz um trabalho primordial para a nossa época; quem conversa com alguém que está desesperado, está trabalhando pelo bem estar daquela pessoa. Toda e qualquer atividade humana que contribua para trazer bem estar está no rol das atividades do direito ao trabalho. Trata-se de uma visão diferente da era do consumo, onde o trabalho objetiva dinheiro para adquirir coisas. Uma vida boa tem muito mais a ver com “ser” uma pessoa humana, do que ter muito dinheiro e contribuir com o colapso da Terra, pelo excesso de consumismo. 1º de MAIO dia do trabalhador, tempo de repensar as relações humanas, visando uma maior justiça social.

(Professora/Doutora  Marilucia Flenik ocupa a cadeira número 17 da Academia de Letras do Vale do Iguaçu). 

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