Milhares de brasileiros voltarão à pobreza com o fim do auxílio emergencial
O Brasil conseguiu diminuir os níveis de pobreza com o auxílio emergencial durante a pandemia da covid-19, mas se os esforços governamentais de assistência à renda não continuarem 15 milhões de brasileiros serão jogados de volta a essa condição em janeiro, alertou Marcelo Neri, diretor do FGV Social e fundador do CPS (Centro de Políticas Sociais).
A extensão dos subsídios está paralisada no Congresso e enfrenta alguma oposição dentro do governo, cuja equipe econômica está preocupada com descontrole do déficit orçamentário. “Estamos entre a cruz e a espada”, disse Neri.
Estudo da FGV publicado nesta quinta-feira (8) mostra que o número de brasileiros pobres — aqueles que ganham menos de meio salário mínimo, ou R$ 515 por mês — recuou 23,7%, atingindo nova mínima histórica de 50 milhões de pessoas, graças ao auxílio mensal, que começou em R$ 600, mas agora reduzido a R$ 300 por mês até dezembro.
O presidente Jair Bolsonaro tenta encontrar uma maneira de manter os pagamentos, mas não há como financiá-los sem romper o teto de gastos e piorar um já elevado déficit orçamentário.
O Brasil foi mais generoso com sua população pobre durante a pandemia do que outras nações latino-americanas, apesar de sua situação fiscal pior e das tentativas do ministro da Economia, Paulo Guedes, de manter esforço de austeridade fiscal, disse Neri.
“Guedes se revelou um gestor de políticas keynesianas surpreendentemente generoso. Agora, a gente está em uma situação em que você precisa ser meio keynesiano, só que a gente não tem recursos”, afirmou.
O Keynesianismo, ou Escola Keynesiana, é uma teoria político-econômica que defende o Estado como um agente ativo contra crises econômicas e alta no desemprego.
O Brasil, que sofreu forte saída de recursos dos mercados de ações e renda fixa no primeiro semestre, corre o risco de gerar ainda mais ruído entre investidores caso aumente as despesas em 2021, alertou Neri, PhD em Economia pela Universidade de Princeton, nos EUA.
O auxílio emergencial foi a iniciativa de maior vulto do governo na crise. Com valor de R$ 600 de abril a agosto e de R$ 300 pelo restante do ano, terá um custo total de R$ 321,8 bilhões em 2020, beneficiando mais de 60 milhões de pessoas por mês.
O senador Ney Suassuna (PRB-PB), membro da Comissão Mista de Orçamento, disse à Reuters que não havia consenso sobre como financiar transferência de renda no próximo ano, apesar da expectativa de que a crise da pandemia continue em meio a uma frágil melhora no mercado de trabalho.
Como na maior parte da América Latina, a pandemia reduziu o tamanho da classe média tradicional, com 4,8 milhões de brasileiros deixando esse grupo devido à perda de renda, disse Neri.
Milhões de pessoas da classe média latino-americana estão sendo arrastadas de volta à pobreza da covid-19, que atingiu o mercado de trabalho da região com mais força do que em qualquer outro lugar do mundo. A pobreza deve voltar aos níveis de 2005 na América Latina. (R7).