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Presidente Jair Messias Bolsonaro e o “Centrão”

O presidente Jair Bolsonaro foi eleito com o discurso da “nova política”. Entre outras, disse que não faria o “toma lá, dá cá”, tradicional negociação de cargos entre governo e Congresso, criticada pela população. 

Há quase um ano e meio no cargo, não se acertou com os parlamentares e, hoje, trabalha sem base sólida e depende dos presidentes da Câmara e do Senado para aprovar pautas do Executivo, sobretudo em meio à crise sanitária provocada pelo novo coronavírus.

Agora, se deu conta de que precisa de suporte no parlamento para manter a governabilidade. Dessa forma, decidiu ir contra uma das bandeiras que o levou ao Palácio do Planalto e se aproximou de lideranças do Centrão para oferecer cargos.

Desde o início do mês, Bolsonaro tem conversado com políticos como o senador e presidente nacional do PP, Ciro Nogueira (PI), e o deputado federal e presidente nacional do Republicanos, Marcos Pereira (SP). O chefe do Executivo ainda recebeu no seu gabinete os deputados Arthur Lira (PP-AL), Diego Andrade (PSD-MG), Jhonatan de Jesus (Republicanos-RR) e Wellington Roberto (PL-PB), que ocupam cargos de liderança dos seus respectivos partidos na Câmara, legendas constantemente envolvidas em corrupção.

Pela primeira vez desde que assumiu a Presidência da República, Bolsonaro se vê contra a parede. A popularidade baixou em meio à pandemia da Covid-19, visto que boa parte dos brasileiros tem reprovado as ações dele para o combate à doença, e o país já enxerga no horizonte uma crise socioeconômica sem precedentes, que acabará caindo no colo do presidente. Diante da realidade, o chefe do Planalto precisa de um “kit de sobrevivência”, caso queira proteger o seu mandato de maiores complicações políticas, e pode ter encontrado no presidencialismo de coalizão a saída tanto para tentar garantir o mínimo de diálogo com o Congresso quanto para se resguardar de um impeachment, visto que há 23 pedidos na Câmara para o seu afastamento. As solicitações aguardam análise.

Por mais que o presidente tenha dito nas manifestações antidemocráticas do domingo que não queria “negociar nada” e que “acabou a época da patifaria” no Brasil, as reuniões com os políticos centristas tiveram como foco o oferecimento de cargos em estatais e instituições de âmbito federal. Abriu-se a possibilidade, por exemplo, para que o PP assuma o comando do Fundo Nacional de Desenvolvimento para Educação (FNDE) e do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs).

O governo ainda estaria disposto a entregar a Fundação Nacional de Saúde (Funasa) ao PSD; a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) e a Secretaria de Mobilidade do Ministério do Desenvolvimento Regional, ao Republicanos; e o Banco do Nordeste e a Secretaria de Vigilância em Saúde, ao PL.

Contudo, para a estratégia funcionar e Bolsonaro receber o tão importante apoio do Congresso, terá de garantir muito mais do que postos de liderança. Os partidos querem estar convictos de que o presidente não vai mais tumultuar o ambiente político, como tem feito. Para as legendas, é mais importante o comandante do Planalto mostrar, de fato, o empenho em fazer com que a parceria dê certo e garantir que, lá na frente, não vai retirar os poderes entregues às siglas.

“É fundamental, neste momento, que ele (Bolsonaro) queira se aproximar do Congresso. Não existe nada que queira fazer hoje que não precise passar pela aprovação do parlamento. Então, ele precisa de uma base mínima no Congresso para poder governar. Está corretíssimo (em conversar com os partidos)”, comentou o senador Ciro Nogueira. “Muito do que ele defende são bandeiras históricas do nosso partido. Portanto, temos uma identificação grande de projetos para o país e precisamos estar alinhados politicamente ao governo.”

Roberto Jefferson

Apesar de condenar o que chama de “velha política”, ao se submeter a essa forma de negociação, Bolsonaro se cola à imagem de antigos caciques partidários. No PSD, ele encontra a figura de Gilberto Kassab, presidente nacional da sigla e atualmente licenciado do posto de secretário-chefe da Casa Civil de São Paulo — os dois, inclusive, se encontraram no Planalto, na última quarta-feira. Já no PL, encontra o ex-deputado federal Valdemar Costa Neto, presidente nacional do partido.

Mesmo não tendo negociado nenhum posto diretamente com o PTB, legenda presidida por Roberto Jefferson, que detonou o mensalão, Bolsonaro se agarrou ao partido por seguir a tese formulada pelo ex-deputado federal de que há um plano formulado pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), com o auxílio do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso; do governador de São Paulo, João Doria (PSDB); do governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC); e do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, para retirá-lo do poder. Há dois dias, Bolsonaro fez questão de compartilhar uma live em que Jefferson explica o “golpe” que estaria sendo arquitetado por Maia.

Por mais que esteja indo na contramão do que defendia nas eleições de 2018 e vendo a sua reputação ligada à de políticos condenados por crimes como corrupção e improbidade administrativa, Bolsonaro parece disposto a correr esse risco, principalmente por ter percebido aí um mecanismo de proteção, no qual é possível colocar no primeiro plano das atenções a “estratégia” do seu afastamento que estaria sendo orquestrada por outros agentes públicos.

“O Ciro Nogueira tem uma boa articulação no Congresso, e o Valdemar Costa Neto é presidente de um dos maiores partidos do centro. O Roberto Jefferson, por sua vez, monta um cenário favorável ao presidente quando fala sobre o Maia, pois mantém a base aliada de Bolsonaro com o olhar em outro lugar, enquanto ele partilha a sua gestão”, analisou o cientista político Enrico Ribeiro, coordenador legislativo da Queiroz Assessoria em Relações Institucionais e Governamentais.

Segundo o especialista, Bolsonaro sabia que, em algum momento, seria cobrado e pressionado pelo Centrão. “A hora, agora, chegou, e ele vai precisar desse pessoal. É uma questão de sobrevivência. Ele vai precisar pelo menos tentar iniciar uma conversa para evitar que sofra impeachment ou que fique, pelos próximos dois anos e meio, sem capacidade nenhuma de governar e com popularidade muito baixa”, explicou. (CB/Política).

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