Em respeito à memória de José Richa, o pai que era diferente do filho. Artigo do jornalista Pedro Ribeiro.

Podem ter certeza de que se o primo distante aparecesse levaria uma cintadas

Dentre os jornalistas, hoje ditos da velha guarda que atuaram nos anos da década de 80 em diante, era muito raro, difícil encontrar um deles que não tivesse simpatia e admiração pelo bonachão e acessível governador do Paraná, José Richa, o primeiro a ocupar o cargo em eleições livres e diretas após anos de ditadura militar. O próprio acesso ao seu gabinete no Palácio Iguaçu estava quase sempre aberto, principalmente no salão que ficava anexo a sua sala de despachos, onde também concedia suas audiências reservadas para tratar de assuntos do estado.

Quem estabelece hoje o paralelo sobre o comportamento do velho turco daquela época com a do seu filho, Beto Richa, duas vezes presos por fortes inícios de envolvimento em atos de corrupção, não deixa de ser tomado por um certo sentimento de melancolia e decepção profunda.

Melancolia nostálgica, misturada a uma saudade dos tempos da investidura de uma representação que dignificava o cargo de governador, que não nos envergonhava, nem mesmo após cumprir seu mandato. Decepção pela constatação daquilo que deveria ser da mesma linhagem ter se revelado um rufião sem capacidade e sem conteúdo, investido no mesmo cargo mas habitante de um mundo paralelo, de futilidades, oportunismo e falta de compromisso com a probidade que dele se esperava, à semelhança do pai.

Era quando concedia entrevistas coletivas à forte imprensa que havia na época, com jornais estaduais de grandes tiragens e presença de repórteres de veículos nacionais que mantinham suas sucursais em Curitiba, que o velho governador parecia de fato se sentir em casa. Não fugia de nenhuma pergunta naqueles anos efervescentes da democracia instaurada no País. Ia logo tirando os sapatos e as meias, sentava-se à cabeceira da mesa, com pés no chão e cuia de chimarrão à mão, e tratava a todos do batalhão de repórteres que o cercava, com respeito e humildade, sem alterar nunca a voz, mesmo diante eventual deselegância de alguns.

Por muitas ocasiões, quando a coletiva terminava, permanecia à mesa batendo papo descontraído com alguns que permaneciam no grande salão. Nessas conversas, algumas vezes, quando lhe perguntavam sobre quem o sucederia na política, sempre mencionava o filho mais novo, Adriano, que se empenhava em criar uma associação nacional de diabéticos. Ao se referir aos demais filhos, manifestava dúvidas se algum deles, Beto ou José Richa Filho, o Pepe, se envolveriam na política. Achava que ambos não levavam jeito, como dizia.

Talvez, o velho turco, por conhecer as personalidades dos filhos, tivesse receio de que pudessem facilmente sucumbir à sedução do poder do cargo, pouco afeitos a também empreenderem esforços para cuidar de assuntos que não fossem os seus, particulares, quanto mais os de paranaenses que um dia pudessem vir a representar. Mesmo quando o filho do meio, Beto, já deputado estadual tentou ser candidato ao governo do Paraná, o velho turco tinha lá suas suspeições, chegando a manifestar em vídeo gravado que o filho “ não está preparado para governar o estado”.

Ele deveria saber do que estava falando!

Faleceu antes de ser submetido à dolorosa decepção que teria se estivesse vivo agora e ver seu filho, duas vezes governador, ser igualmente preso por duas vezes por envolvimento em ilicitudes e atos de rufianismo do dinheiro público. E puxar atrás de si o outro irmão, o Pepe, que hoje se esconde da justiça para não ser intimado, ambos com graves denúncias que lhes pesam sobre os ombros. E, por vaidade fútil e caráter frágil, jogar o nome da família em tenebrosas transações, patrimônio que o velho governador tratou sempre com zelo.

Por ironia, o único filho em quem José Richa apostava haver uma certa inclinação para o mundo político, nunca disputou uma eleição, permanece até hoje cuidando de seus interesses na área privada, e não lhe pesa qualquer acusação. Ao menos este consolo, restaria ao sempre lembrado como um dos mais democráticos governadores que o Paraná já teve.

Não posso omitir que o velho amigo José Richa, com quem tive o prazer de participar das peladas com amigos no Canguiri, na Paraná Equipamentos e depois no Malutrom, tinha um hobby que as vezes, por alguns momentos, esquecia dos compromissos do Estado: jogar baralho. 

(* Pedro Ribeiro é um dos mais antigos e respeitados jornalistas do Paraná, com quem tive a honra de conversar dezenas de vezes, sempre demonstrando muita atenção e interesse pela história da nossa região).

José Richa, como prefeito de Londrina, visitou União da Vitória no início de década de 70, a convite do deputado estadual Domício Scaramella. Tive a honra de com exclusividade entrevistá-lo para a Rádio Colmeia e para o jornal O Comércio. E ele nunca esqueceu. Cada vez que me encontrava batia na minha barriga e dizia “está ficando como a minha”… E a foi na enchente de 1983, já como governador, que José Richa passou a ser admirado pela população de União da Vitória.

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