A obsessão dos pastores com a ilha deserta

——-(por Renato Terra, na Folha de São Paulo)——–

Fragmentos de um discurso homofóbico

No dia 19 de setembro, uma comissão da Câmara discutia um projeto de lei pela proibição do casamento homoafetivo. Foi quando o pastor Pastor Sargento Isidório (Avante-BA) recorreu a esta elaborada reflexão: “Homem nasce como homem, com binga, portanto, com pinto, com pênis. Mulher nasce mulher, nasce com sua cocota, sua tcheca, portanto sua vagina. Mesmo com o direito à fantasia, homem mesmo cortando a binga não vai ser mulher, mulher tapando a cocota, se for possível, não será homem”.

A obsessão dos religiosos evangélicos com a ilha deserta não é de hoje. “Vamos arrumar uma ilha deserta e mandar dois gays para lá. Quero ver se depois de anos haverá raça humana”, disse Silas Malafaia em 2013. “Coloca essas pessoas numa ilha e depois de 50 anos volta para ver; não vai ter mais ninguém”, declarou o vereador em Mato Grosso do Sul pastor Sérgio Nogueira, em 2014.

Não precisa nem evocar a imagem de Tom Hanks em “O Náufrago”. A sugestão é tão descabida que basta imaginar a mesma situação com um casal hétero.

Coloque Victoria e David Beckham largados e pelados numa ilha deserta e depois de 50 anos volte para ver. Imagine desovar Angélica e Luciano Huck numa ilha deserta e dizer: “Procriem! Voltamos em 50 anos!”.

Alguém imagina que, décadas depois, encontraremos uma prole saudável que planta, caça, constrói casas nas árvores, empreende e faz crossfit? Mas, mesmo que isso aconteça, os pastores sugerem que os filhos procriem entre si? Duvido.

Aos fatos: em 2016, o casal Linus e Sabina Jack “arrumou” uma ilha deserta no oceano Pacífico. Durante duas semanas, 14 navios e dois aviões foram mobilizados. O casal hétero foi resgatado depois que oficiais da Marinha americana sobrevoaram o local e leram o sinal de SOS escrito na areia. Não houve clima para procriação.

A lista de argumentos baseados na realidade é bastante longa. Mas, se quisermos embarcar no delírio da ilha deserta, ainda é possível formular uma pergunta: “Vamos arrumar uma ilha deserta e mandar um casal de pastores evangélicos para lá. Quero ver se depois de 50 anos alguém estará rico. Ou tenha sido eleito deputado”.

Posts Similares

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *