Reunião dos líderes da América do Sul termina sem medidas concretas e críticas ao presidente Lula
A reunião entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e líderes dos demais países da América do Sul terminou com um comunicado sem medidas concretas e com promessas de ampliar a integração da região. Chamado de ‘Consenso de Brasília’, o documento final do encontro, assinado por todos os presentes, traz uma breve menção à visão de que o continente é comprometido com a democracia e direitos humanos, apesar dos elogios do petista ao presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, que provocaram críticas dos presidentes do Uruguai, Luis Lacalle Pou, e do Chile, Gabriel Boric.
Um grupo de contato composto pelos chanceleres dos 12 países sul-americanos será criado para discutir a criação de um mapa do caminho para a integração da América do Sul, a ser submetido à consideração dos Chefes de Estado. Os presidentes concordaram em voltar a reunir-se, em data e local a serem determinados, para repassar o andamento das iniciativas de cooperação sul-americana e determinar os próximos passos a serem tomados.
Conforme o esperado, não houve acordo sobre o relançamento da União das Nações Sul-Americanas (Unasul), criada em 2007 e conhecida por reunir governos alinhados à esquerda no continente. Com as trocas de guarda por governos de direita em diversos países, a partir de 2015, a entidade perdeu força política.
Os líderes presentes à reunião também concordaram em aumentar a cooperação econômica da América do Sul, que terá como meta a criação de uma área de livre-comércio sul-americano. Outro ponto do documento divulgado pelo Itamaraty diz que os presidentes da região concordaram em trabalhar por mecanismos inovadores de financiamento da ação climática com os países desenvolvidos, entre eles a troca de dívida por ação climática. Os chefes de Estado ainda defenderam uma gestão ordenada, segura e regular das migrações na região.
A proposta de Lula de adoção de uma moeda única para transações comerciais na região foi mencionada discretamente no texto, que prevê “a aplicação de medidas de facilitação do comércio e de integração financeira”.
Discórdia sobre Maduro
A cúpula, no entanto, foi ofuscada pela reunião bilateral entre Lula e Maduro, na segunda-feira, na qual o presidente brasileiro defendeu Maduro e o regime venezuelano. Na ocasião, o petista disse que relatos de violações de direitos humanos, autoritarismo e restrição das liberdades democráticas na Venezuela eram fruto de uma “narrativa”.
As declarações de Lula provocaram ruídos na reunião de hoje. Os presidentes do Chile, Gabriel Boric, de centro-esquerda, e do Uruguai, Luis Lacalle Pou, de centro-direita, reagiram com críticas à defesa do regime venezuelano feita pelo presidente brasileiro.
“Não se pode fazer vista grossa a princípios importantes. Discordo do que Lula disse ontem. Não é uma construção narrativa, é uma realidade e tive a oportunidade de ver em centenas de milhares de venezuelanos que vivem na nossa pátria”, afirmou Boric, cobrando respeito aos direitos humanos.
Lacalle Pou, por sua vez, se disse surpreso com as declarações de Lula. “Fiquei surpreso quando se disse que o que acontece na Venezuela é uma narrativa. Vocês sabem o que nós pensamos da Venezuela e do governo da Venezuela”, reagiu o uruguaio. “Se há tantos grupos no mundo tentando mediar a volta da democracia plena na Venezuela, para que haja respeito aos direitos humanos, para que não haja presos políticos, o pior que podemos fazer é tapar o sol com um dedo. Vamos dar o nome que tem e vamos ajudar.”
Política externa em xeque
Para analistas, a posição de Lula prejudica o Brasil e coloca o País como aliado do regime chavista. Em sua conta no Twitter, Oliver Stuenkel, professor de relações internacionais da FGV-SP e colunista do Estadão, escreveu: “A retórica incrivelmente bajuladora de Lula em relação ao venezuelano Nicolás Maduro – cuja repressão sistemática e abusos de direitos humanos estão bem documentados – é muito mais prejudicial à reputação internacional do governo brasileiro do que qualquer outra coisa que Lula tenha dito ou feito até agora”, afirmou em sua conta no Twitter.
Stuenkel também escreveu que “ao abraçar explicitamente a linha oficial do governo Maduro, Lula se posicionou como um dos principais aliados da Venezuela – e a maioria dos outros aliados da Venezuela são regimes autocráticos. Isso basicamente exclui o Brasil de qualquer papel potencial de mediação na Venezuela”.
Já o jornalista venezuelano e colunista do Estadão Moisés Naím, perguntou: “Lula acredita honestamente que o colapso da Venezuela e o sofrimento de milhões de pessoas se deve ao que ele chama de ‘narrativa construída?’. Quem conta uma história tendenciosa sobre as causas da nossa tragédia é ele e Lula sabe disso”, afirmou.
(COM INFORMAÇÕES DO ESTADO DE SÃO PAULO E BEM PARANÁ).